✍🏼 Augusto dos Anjos


O conteúdo desta página foi retirado de ALVES e MARTIN (2016) (pp. 85-86).

ALVES, Veredas da Palavra 3, e Vima Lia MARTIN. 2016. Veredas Da Palavra (Vol. 3). São Paulo: Ática.

A poesia produzida no início do século XX

Augusto dos Anjos

Augusto dos Anjos: um poeta original

Autor de um único livro, intitulado Eu (1912), Augusto de Carvalho Rodri- gues dos Anjos é considerado singular. Seus poemas, quase sempre sombrios, expressam uma angústia existencial e uma atitude pessimista diante da vida, não encontrando pontos de convergência com nada do que se produzia no pe- ríodo pré-modernista.

Leia o que escreveu Rodrigo Cardoso sobre a arte de Augusto dos Anjos:

Importante

Situada fora da linha cronológica e estilística da literatura nacional, a lí- rica do “poeta hediondo”1, como ele mesmo se denominava, serve como exemplo de confluência2 estética no campo artístico, sendo possível inscrever nela boa parte das temáticas de obras de alguns dos poetas mais eminentes3 de nosso país e, ao mesmo tempo, vislumbrar4 características até hoje sem par […].

Psicologia, poesia e pintura concatenam-se5 em sua linguagem extrava- gante. O certo é que o poeta, como grande artista universal que era, desejou evidenciar novos ângulos sobre os seres, as coisas e a própria arte, notada- mente a poética.

CARDOSO, Rodrigo. As expressões do Eu. Revista Literatura, São Paulo, n. 25, p. 44, 2010.

5 concatenam-se: estabelecem relação entre, relacionam.

4 vislumbrar: perceber, entrever, avistar.

3 eminentes: importantes, destacados, que ocupam posição elevada, proeminentes.

2 confluência: qualidade do que é confluente, convergente, aquilo que corre para o mesmo ponto.

1 hediondo: repelente, repulsivo, horrendo.

O uso da palavra considerada apoética, o arranjo singular e expressivo de ideias, a recorrência à ciência como metáfora geradora de imagens são algumas características marcantes do autor, as quais se evidenciam em sonetos como “Psicologia de um vencido”, reproduzido a seguir.

Psicologia de um vencido
      Eu, filho do carbono e do amoníaco,
      Monstro de escuridão e rutilância6,
      Sofro, desde a epigênesis7 da infância,
      A influência má dos signos do zodíaco.

      Profundissimamente hipocondríaco8,
      Este ambiente me causa repugnância…
      Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
      Que se escapa da boca de um cardíaco.

      Já o verme – este operário das ruínas –
      Que o sangue podre das carnificinas
      Come, e à vida em geral declara guerra,

      Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
      E há de deixar-me apenas os cabelos,
      Na frialdade inorgânica da terra!

ANJOS, Augusto dos. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. p. 203.

8 hipocondríaco: em sentido literal, é aquele que se julga permanentemente doente; em sentido figurado, triste, melancólico.

7 epigênesis: teoria segundo a qual a constituição dos seres se inicia a partir de uma célula sem estrutura e se faz mediante sucessiva formação e adição de novas partes que, previamente, não existem no ovo fecundado; epigênese.

6 rutilância: qualidade do que é rutilante, muito brilhante, resplandecente.